segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

MATUTANDO SOBRE A VIDA E SOBRE DEUS


Eu estava matutando nesses dias sobre tudo o que tenho lido, meditado, e vivido nesses turbulentos anos de ministério no que diz respeito às tantas catástrofes, violência urbana, corrupção e descaso para com os mais fragilizados e carentes.

Tenho recebido pessoas tão carentes e tão sufocadas que me parece refletir a imagem de alguém cuja oportunidade de superação esperada com esforço por muito tempo é passada a vez por causa de outro com mais força e habilidade que, naquele momento não respeita a dor o mais necessitado ou visa a resposta egoísta em detrimento da carência coletiva. Afinal outra pessoa consegue perceber ou até preconizar onde e quando as águas são agitadas pelo anjo. Os outros que se danem.

Isso também pude observar no esforço da tanta gente querendo ajudar ao povo sofrido do Haiti enquanto alguns insensíveis se acham no direito de desviar alguns recursos em nome de uma necessidade nem de longe emergencial. Sem falar da dor que sentimos nos casos absurdos de pessoas que matam a granel. É evidente a desumanidade à flor da pele humana.

Nesse momento oro, não mais ao Deus da minha consciência infantil que me parecia o super-homem pronto a me defender das aflições das garras do mal; nem mesmo oro ao Deus de minha consciência juvenil que parecia me garantir o céu após esse tempo de dor.

Lembro que meu pai era o meu super-herói, totalmente capaz de resolver todas as questões. “Vou dizer ao meu pai! Ele resolve isso rapidinho!”

Cresci e com isso minha relação com a vida e com meu pai. Enquanto isso, a categoria de super-herói de meu pai foi abrindo espaço para outro entendimento. O meu pai não era meu super-herói porque resolvia tudo, mas porque me amava e estava sempre disposto a me escutar as lamúrias infantis razoáveis. Com o tempo fui aprendendo que ele não era o todo-poderoso na categoria que imaginava, mas que sua verdadeira força de todo-poderoso estava em sua capacidade de se baixar e conversar comigo olhando nos olhos e revelando sua autoridade que se baseava no esforço de me tornar homem maduro e me conduzir à responsabilidade diante da vida. Toda a idéia de compensação de minha mãe; aliás, nossa mãe tem esse jeitinho de conquistar. Toma no colo e diz que depois a mãe vê isso, depois a mãe recompensa. Mas, toda essa beleza de relacionamento é um esforço de nos tornar homens e mulheres capazes.

Quando oro, me debruço sobre os textos sequentes das Escrituras, e percebo que isso também acontece na minha relação com Deus. Diferente do de um super-homem, ele não aparece para resolver, mas como um pai maravilhoso resolve passar todo o tempo conosco em amor nos ajudando em nossas crises, enquanto propõe aos da família se juntarem a ele nesse propósito que torna todo filho e filha dignos e dignas. O poder do Pai está na prodicidade de seu amor que desafia-nos ao envolvimento.

Então, como a força do meu pai, que não deixou de ser grande, a força de Deus está em se projetar nos filhos, enquanto nos desafia a viver intensamente essa parceria. Claro que meus devaneios não respondem às tensas questões das demandas da vida, mas sinceramente para mim o caminho se torna mais claro ao perceber Deus nas lágrimas de um bombeiro que segura a mão de uma sobrevivente ainda debaixo dos pesados escombros dos desastres cegos da vida.

Deus não parece menos Deus quando se reflete no pequeno. Que diga isso a encarnação de Jesus. Deus não parece menor porque supostamente não resolve as coisas de acordo com a nossa cartilha. Que diga a sua atitude, que parece com a nossa, diante da cruz quando se debate em lágrimas sem perceber a presença do Pai.

Deus é lindo e maravilhoso, não porque é capaz e esperado como resposta mágica aos conflitos de uma sociedade narcisista e egocêntrica. De certa forma, acabaríamos reclamando o porquê tanta necessidade de oração a cada vez que sofremos em vez de vermos uma operação do todo-poderoso em erradicar o mal ainda em nossa vida aqui com as habilidades correntes, e não somente quando houver súplica diante de um episódio que acaba conflitando com o quadro macro da sociedade.

Deus é lindo e maravilhoso porque em meio a tanta dor, aflição e desconforto, nos trata com amor e dignidade. Enquanto sofre com os sofridos dispondo-lhes força consoladora e resiliente, convida a todos para se engajarem nesse projeto de transformação da criação.

Josué