terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Percebendo Sua doce Presença

“Vá com Deus, meu filho”. – Diz a mãe chorosa ao se despedir de seu filho.

“Quantas pessoas virão com você?” – Alguém pergunta ao telefone.

“Só eu e Deus”. – Responde o rapaz certo de que não estaria só durante a caminhada.

A dedução de uma conversa como essa resulta em um misto de fé e fuga do medo de uma possível solidão.

Claro que eu creio na presença mística de Deus. Ela é real e independente da matéria. Aliás, essa presença é uma exposição divina e eterna.

Muitas pessoas conseguem sentir a satisfação da presença desse Ser divino. Algo parece sobressair-se ao sentimento de solidão. Algumas vezes essa satisfação é percebida, nos momentos de solitude. Nem preciso explicar sobre a diferença entre solidão e solitude, né? Se a solidão independe a quantidade de pessoas perto de mim, a solitude apenas exige minha vontade de ficar comigo mesmo. Esse tempo é uma porta sensível a essa presença. Os Salmos 42 e 43 parecem dizer isso. Trata-se de um encontro íntimo que nasce com o medo e o abatimento: “Por que estás abatida, ó minha alma? Espera em Deus”. Interessante que num encontro só o poeta articula um diálogo que explora seu interior ávido por socorro enquanto está propenso a uma entrega submissa à Presença até então imperceptível. “Espera em Deus”.

A fé satisfaz a carência do Ser, pois torna possível a sintonia com a doce Presença. Muitas vezes nos sentimos incompletos. Isso se dá porque somos seres gregários e, como é interessante vê que Deus, em sua sabedoria se harmoniza a fim de se dá a conhecer a partir do ser humano. Que quero dizer com isso, senão que essa Presença tantas vezes acontece, mas é imperceptível devido a nossa necessidade de perceber Deus de forma externa, isso é, fora de nós.

Penso que nos equivocamos quando nos fiamos de uma presença externa e, usando o termo da oração, cujo Pai está lá “no céu”. Essa compreensão demonstra a distância do nosso habitat e de nossa realidade. O fato do “Tu dos tus” (GOUVÊIA) que declara a necessidade do outro, não ofusca a realidade da imanência. O céu que parece tão distante quando lido à cor de uma interpretação geográfica perde esse peso à medida quando entendido de um céu cuja dimensão lembra mais uma freqüência invisível, mas real, uma dimensão diferenciada da percepção comum sensorial humana.

Quando penso na presença de Deus estou assimilando como certo o esforço de Deus que se dignifica em se dá a perceber e ao mesmo tempo a conhecer um pouco mais sobre esse mistério.

A encarnação parece dizer isso: 1) O verbo (Palavra) que se torna carne; 2) A carne (gente) concreta que exala glória; 3) Glória que se reflete com graça e verdade. Deus se faz presente, não como um ser divino que nos tira da realidade, mas que encara tal realidade.

Tive a oportunidade de ouvir de um teólogo poeta apaixonado pelo mistério da presença divina dizer: “Busquei Deus fora de mim e não o encontrei. Busquei Deus dentro de mim, mas foi em vão. Busquei Deus no próximo e nos encontramos os três”. Esse é o jeito de Deus de interagir conosco. Deus prefere andar com gente, como gente, e como gente se faz presente no meio da gente.

Facilmente encontramos na bíblia que “ninguém pode ver Deus”. Pois, nesta mesma bíblia podemos encontrar o ensino que é em Jesus que podemos ver Deus.

Mais do que identificar Jesus como Deus encarnado, posso deduzir que a única (ou melhor) maneira que Deus achou para entrar na freqüência humana foi em Jesus, ou seja, se “hominizando” (BOFF), assim é como ele se revela a nós e nos eleva nessa revelação. Quando Deus quis ser melhor conhecido pelo homem se tornou gente, para que a gente toda se envolvesse nesse ministério de que Deus continua sendo assumido por pessoas que se tornam pequenos cristos, filhos e filhas de Deus. Desse modo a voz de Deus é ouvida através da voz humana, as mãos de Deus são estendidas quando pessoas se dispõem, e o Seu coração se envolve quando nossos corações amam o alvo de Seu amor. Quem sabe não é esse mesmo o sentido dos textos que nos incitam à hospitalidade, já que os antigos receberam anjos pensando receberem pessoas, e por que não dizer pessoas como se fossem anjos!?

Isso também exige de nós maior atenção, já que ao assumirmos a ação do Filho de Deus como filhos e filhas de Deus e do Cristo como cristãos, estamos também assumindo o dever de lutarmos por um mundo melhor, e ainda, garantindo a encarnação de Deus e de seu Cristo numa presença transformadora. Além de percebê-lo no outro, no encarnado com sua imago dei (imagem de Deus). Assim sua Presença é real em cada cuidado ao próximo, cada visita ao necessitado, cada ombro amigo, cada mão estendida. Uma sacada interessante que li em Harold Kushner foi em perceber Deus em toda boa e sincera ação humana. Desse modo, Deus, não somente está encarnado no outro como também soma força de existência que supera toda ansiedade. Sim, é possível lutar por um mundo melhor com a doce presença do Pai que sonha com sua família unida, crescida e transformada vivendo seu amor e mutualidade. É possível, pode sonhar, mas também se importe com essa realidade.